Me examinem, se examinem:
Re pressão
E as regras
medidas
já disseram o meu tamanho
Um tamanho entre o médio e o exagerado,
mas ainda estou dentro das referências?
Ou será que as perdi.
qual dia seria rebelde,
sem mais medo do açoite?
dum açoite do medo,
tão medonho quanto o próprio açoite,
tão medonho quanto o próprio medo,
tão medonho
ser,
De uma existência de medo,
de uma vida medrosa.
Mas minha cabeça excede a régua,
ao centímetro,
ao grau,
E aí,
o nervo contesta,
mas a carne tem medo,
E a carne,
anda comendo medo,
anda comendo nervo,
E o nervo vê que é carne,
Estúpido ser tão interior,
Mas o que não é ser senão interno.
Vive só?
em si?
Entre a pedra e a cabeça,
está a revolta,
e a revolta que a cabeça tem com a pedra,
faz ter receio,
ter receio
da revolta da pedra contra a cabeça,
receio
da queda,
do murro,
do não.
Mudar exige,
exige muito,
exige outro dentro de mim
alguém que não compro nem vejo,
Mudar me exige
me exige coragem,
Coragem muda,
Coragem nasce.
07/05/2010
06/03/2010
"Minha História"
João do Vale
http://www.radio.uol.com.br/musica/joao-do-vale/minha-historia/200814
(abra em outra aba ou janela para poder ler aqui...)
Seu moço, quer saber, eu vou contar num baião
Minha história pra o senhor, seu moço, preste atenção
Eu vendia pirulito, arroz doce, mungunzá
Enquanto eu ia vender doce, meus colega iam estudar
A minha mãe, tão pobrezinha, não podia me educar
A minha mãe, tão pobrezinha, não podia me educar
E quando era de noitinha, a meninada ia brincar
Vixe, como eu tinha inveja, de ver o Zezinho contar:
- O professor raiou comigo, porque eu não quis estudar
- O professor raiou comigo, porque eu não quis estudar
Hoje todos são “doutô”, eu continuo joão ninguém
Mas quem nasce pra pataca, nunca pode ser vintém
Ver meus amigos “doutô”, basta pra me sentir bem
Ver meus amigos “doutô”, basta pra me sentir bem
Mas todos eles quando ouvem, um baiãozinho que eu fiz,
Ficam tudo satisfeito, batem palmas e pedem bis
E dizem: - João foi meu colega, como eu me sinto feliz
E dizem: - João foi meu colega, como eu me sinto feliz
Mas o negócio não é bem eu, é Mané, Pedro e Romão,
Que também foram meus colegas , e continuam no sertão
Não puderam estudar, e nem sabem fazer baião
Não puderam estudar, nem sabem fazer baião
Minha história pra o senhor, seu moço, preste atenção
Eu vendia pirulito, arroz doce, mungunzá
Enquanto eu ia vender doce, meus colega iam estudar
A minha mãe, tão pobrezinha, não podia me educar
A minha mãe, tão pobrezinha, não podia me educar
E quando era de noitinha, a meninada ia brincar
Vixe, como eu tinha inveja, de ver o Zezinho contar:
- O professor raiou comigo, porque eu não quis estudar
- O professor raiou comigo, porque eu não quis estudar
Hoje todos são “doutô”, eu continuo joão ninguém
Mas quem nasce pra pataca, nunca pode ser vintém
Ver meus amigos “doutô”, basta pra me sentir bem
Ver meus amigos “doutô”, basta pra me sentir bem
Mas todos eles quando ouvem, um baiãozinho que eu fiz,
Ficam tudo satisfeito, batem palmas e pedem bis
E dizem: - João foi meu colega, como eu me sinto feliz
E dizem: - João foi meu colega, como eu me sinto feliz
Mas o negócio não é bem eu, é Mané, Pedro e Romão,
Que também foram meus colegas , e continuam no sertão
Não puderam estudar, e nem sabem fazer baião
Não puderam estudar, nem sabem fazer baião
04/02/2010
Uma Vida Para Desaprender
Por Face Inoculta
Fingir. Como em cada começo do ano. Como se esse ano não fosse ser a mesma repetição do ano anterior. Como se tudo fosse se passar melhor: eu vou estudar mais, os professores serão menos idiotas, minha vida terá um pouco mais de sentido.
Minha vida, como se ela me pertencesse. E o futuro que o esperamos. E, depois, há aquele sentimento estranho: mas o que é que eu estou fazendo aqui?
Ah, eu não sei direito. Disseram-me que eu deveria ir à escola, um dia, e desde então eu vou todos os dias. Logo, virou normal. E a questão continua sem resposta... a única coisa clara, em todo caso, é fazer aquilo que esperam de mim. E nesses momentos de fraqueza, de desespero, nesses momentos nos quais eu não posso mais, o único refúgio que me resta é não mais pensar e obedecer. Fazer o que minha agenda manda, e isso pode fazer bem. Um bem assombrosamente vazio, um conforto incrivelmente oco, uma felicidade infinitamente triste, nos quais, lá dentro, eu me detesto. Eu me detesto ao ver os outros, os adultos, tão satisfeitos e seguros de me verem abandonado a suas esperas. Eu me detesto ao ver os outros, meu amigos, preferirem-me quando eu me adapto aos seus olhares. Eu me detesto ao não conseguir fazer com que eles gostem da minha imagem, e eu me detesto ao gostar de mim quando eu consigo. Eu me detesto ao voltar sempre a isso aqui, quando eu gostaria de estar em outro lugar.
Na verdade, eu me detesto ao me ver viver, e de ter consciência. Eu tenho essa impressão estranha que tudo que eu poderia viver já passou. Em outro lugar. Na televisão por exemplo. Que a escola, a vida inteira, é um clipe da MTV onde eu estou sempre procurando saber como aparecer bem, tentando encontrar o melhor ângulo pras câmeras, pros espelhos, olhando-me atuar na minha própria vida.
Fingir. Como em cada começo do ano. Fazer como se... Eu não posso mais. Aflição por não saber porque eu choro, aflição por não conseguir gritar, aflição por não estar nunca aflito. Nós estamos mortos num mundo que nem nascemos, mortos por não poder habitar um mundo que é só concreto e vitrines, mortos por sermos apenas imagens. Eu não serei mais uma vitrine: eu me quebro para começar a viver. Isso é o início. Se você quebra a sua, NÓS poderemos quebrar outras. Tirar o clipe da MTV de nossas vidas destruindo seu cenário. Desertar, é tornar deserto um lugar que esperam que cheguemos, nossos professores, nossos pais, a polícia, nossos namorados, e antes de tudo, nós mesmos. A dois nós seríamos fortes, e NÓS somos mais que dois. NÓS somos mais numerosos a cada dia, e o concreto, reflexo da nossa miséria, treme para desaparecer. Existem encontros a serem feitos, amizades para se encontrar. Nós temos quase todos um grupo de amigos com quem passamos o tempo, fumamos um, vamos à praia, vemos um filme, saímos a noite... Um grupo para dividir tristes paixões. Um grupo que nos assegura, que nos deixa sozinhos juntos, que nos diverte. Eu estou perdido para me encontrar, aqui onde o que procuramos está em outro lugar.
Na escola eu me sinto como um rato na gaiola. Uma gaiola com suas regras, seus hábitos, suas punições. Seus códigos, seus comportamentos, suas atitudes que sem parar nos contêm. Ou quase. Eu sinto as vezes como faíscas, faíscas de luz no escurecer do nosso cotidiano. Uma solidariedade no roubo, na conspiração, no silêncio que segue uma incitação à denúncia. Que toda a classe se une pra resistir de qualquer forma a um professor quando ele é autoritário, e uma nova felicidade se instala entre nós. Uma exaltação. Falamos sobre isso o dia todo, durante semanas! Se só isso pudesse ser sempre assim... mas é difícil. É difícil prolongar esses momentos de resistência face aos professores que nos ameaçam, que nos reprovam. Tínhamos feito o certo. É difícil porque mesmo nos momentos intensos, nós somos sempre pegos pela nossa solidão para nos assombrar desde que isso acabe.
Quando um professor nos ameaça de não dar aula até que seja denunciado o responsável por alguma infração, é extremamente engraçado ver que ele não pode fazer nada desde que não digamos nada, que ele fica completamente perdido quando continuamos calados. Infelizmente, quase sempre tem um que solta, que colabora. Nós aprendemos. Quase sempre os mesmos, mas as vezes temos surpresas, traições. Isso não pode nunca acontecer. Não mais traidores! Nós deveríamos lhes dar o que merecem, socos no estômago. A fim de que eles aprendam que não são mais do que um professor, ou mesmo um policial. Que eles compreendessem que é por conta de gente como eles que vivemos numa “sociedade de merda”, na qual ninguém liga pros outros se cada um tiver seu dinheiro, sua casa, seu carro zero.
Dizem-me frequentemente que se eu não estou contente eu posso mudar eu mesmo. Porque “minha liberdade começa onde acaba a liberdade do outro”, eu não devo querer mudar nada mais. Eu tentei e isso não funciona. Eu acabei percebendo por que: eliminar a parte de si que detestamos é também destruir tudo aquilo que a alimenta. O mundo da mentira. A ilusão de liberdade. Eu prefiro pensar que minha liberdade começa onde começa a dos outros, e que esse estúpido provérbio só existe para nos lembrar de não “mexer” com ninguém, de “respeitar” o indivíduo, que assim tudo continua no seu lugar.
Não nos incomodemos.
Então querem que eu me cuide, porque sou EU que não vou bem, porque os gritos levam ao prisão e as pedras à prisão. Querem que façamos como se fôssemos nós a causa da doença, como se não estivéssemos cercados de desolação. A psiquiatria, toda forma de espiritualidade individual, de organização de caridade, as ONG's, e o comércio solidário estão aqui para nos vender a boa consciência, para nos vender a esperança de uma reconciliação. Eu não cairei mais na armadilha desta falácia, onde cada nova imagem da felicidade é a confissão da mentira da imagem anterior.
Eu me sinto mal ao ver meus pais quererem meu bem repetindo só o que esse mundo quer para ele mesmo. É agora que estou triste, e desde sempre, mas eles continuam a falar de uma felicidade que está a vir, a me dizer que encontrarei meu caminho aqui onde tudo parece estar fechado, que foi só um passo mal dado. “Vai dar tudo certo.” Mas parece que o passo mal dado não passa, e que o futuro que eles me falam sempre estará a vir. Se estamos na escola nos falam sem parar de universidade; na universidade nos falam sobre trabalho; no trabalho nos falam da aposentadoria, e depois da aposentadoria preparamos uma morte tranquila que começou desde a escola. Nos ensinam a viver o futuro simples. “O ano que vem você será...”, “daqui a pouco eu serei...” Nossos pais, tristes crianças de suas épocas, não sabem, a maioria, que nos ensinam a sobreviver da melhor maneira que seja. A sobreviver de uma melhor maneira que eles fizeram. Minimizar ao melhor as olheiras, o álcool, os antidepressivos. Ganhar suficientemente dinheiro, ter um bom status, reiterando ao mesmo tempo cinicamente que “o dinheiro não faz a felicidade”. A felicidade, está a nós para descobrimos, na nossa vida dita “privada”, nessa preocupação paliativa que é a construção de si mesmo.
Olhe nossos pais; eles são felizes? Eles são verdadeiramente felizes? Eles não parecem mais carregar um peso – visível nas olheiras – de ter sacrificado a vida a uma certa ordem das coisas? Os venderam essa mesma mentira que querem nos vender hoje com muito mais histeria, histeria que só faz desmascarar essa ilusão:
“Sua vida consistirá em engessar um muro que está desmoronando, mas como se você não soubesse.”
E nós replicamos:
“Nós não queremos suas olheiras, nem mais o seu gesso e suas mentiras. Não, nós não queremos parecer verdadeiramente felizes. Nós largamos nossos trilhos. Nós temos a intuição de que isso que esconde esse muro que já cai em migalhas, acabará em cinzas. Um amigo disse que a característica destrutiva demole o que existe não por amor as ruínas, mas pelo amor dos caminhos que as atravessam.
Nós acreditamos, e nossa força cresce a cada dia.”
29/01/2010
A arvorezinha de folhas brancas, o tio da escola.______ intertexto-idéia do l.m.
Outro dia estávamos eu, Pequi Atômico, L.M. e alguns outros em frente à escola, conversando e arrancando umas folhas de uma arvorezinha e brincando com elas. As folhas tinham uma cobertura macia de uma praga, que parecia algodão. Não era a coisa mais inocente do mundo o que fazíamos, como crianças que estragam tudo se divertindo, mas a gravidade ambiental do nosso entretenimento não nos impediu.
Quando todos já se entusiasmavam limpando as folhas, um senhor, que trabalha de vigia noturno na escola e usa uma camiseta velha escrita "COLABORADOR", abriu a janela bem atrás de nós, fez uma cara de preocupação, e brigou. Nos advertiu porque a árvore é patrimônio da escola e o patrão é dono da escola... Não disse assim nessas palavras, só brigou, mas ora, ele vende sua força de trabalho ao patrão em troca de um mísero salário, e na relação hierárquica, assume essa atitude de cuidar da manutenção desse patrimônio, do qual na verdade é totalmente alienado!
Isso também ele nos contou depois, do lado de fora, na calçada, explicando que não brigou por mal, nem nos conhecia, mas que às vezes acontecia de descarregar a raiva em bobagens assim. Num tipo de confissão comentou que, pôxa, trabalha numa escola e sequer sabe ler. E que estava um pouco velho já, em tempo de aposentar, e ficava dormindo ali naqueles malditos bancos de madeira, vendo televisão até altas horas da madrugada.
Isso também ele nos contou depois, do lado de fora, na calçada, explicando que não brigou por mal, nem nos conhecia, mas que às vezes acontecia de descarregar a raiva em bobagens assim. Num tipo de confissão comentou que, pôxa, trabalha numa escola e sequer sabe ler. E que estava um pouco velho já, em tempo de aposentar, e ficava dormindo ali naqueles malditos bancos de madeira, vendo televisão até altas horas da madrugada.
Nos contou esses segredos, e quando terminamos de ouvir, depois de uns segundos paralisados, o maluco do Pequi, que havia começado a brincadeira de arrancar folhas, espiou a pequena árvore e de repente saltou no rumo dela e a atacou até quebrá-la, num ludismo feroz, como um favor àquele senhor sentado ao nosso lado.
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